Residência CIDADE Lisboa
Espaço Alkantara 9—21 Agosto 2021
Este ano, Terra Batida organizou um programa de residência em Lisboa que contou com a participação de diversos agentes e colectivos. Durante 2 semanas, instigaram-se visitas e debates sobre a cidade de Lisboa e suas dinâmicas de trânsito, circulação e exclusão. A residência contava com o convite especial a Ana Pi, artista coreográfica e da imagem, e Irineu Destourelles, artista visual, que junto com Rita Natálio, partiparam de um programa de conversas, passeios e práticas acolhido pelo espaço Alkantara.
A residência começou com uma ida ao Jardim Botânico Tropical, guiada por António Carmo Gouveia, doutorado em ecologia de plantas e investigador do Departamento de Ciências da Vida e Centro de Ecologia Funcional da Universidade de Coimbra. Ali enunciámos o primeiro conflito ecológico da cidade: discutiu-se a maquinaria histórica de epistemicídio, extrativismo e migração forçada de plantas no contexto deste jardim, cujo sentido instrumental aliado ao processo colonial, embora perdido atualmente, não se atualiza numa re-ocupação ou reparação histórica, mas antes como template para o turismo.
Com António Brito Guterres, urbanista e dinamizador de diversas iniciativas na cidade de Lisboa, fizemos uma imersão na história e a geografia de uma cidade partida e segregada espacialmente, onde se entrelaçam camadas temporais de uma história colonial e económica que se desdobra infinitamente em construções e remoções violentas nos chamados “bairros periféricos”.
Encontrámos Di Candido aka DIDI, corpe afroqueer em trânsito por Brasil, UK e Portugal, que trabalha, persiste e resiste por meio da pesquisa, produção cultural e performance como DJ, cantore e artista visual/multidisciplinar. A percepção do espaço urbano lisboeta e dos trânsitos a partir de suas investigações práticas que convocam as vidas e os corpos afrodescendentes, foram o centro da nossa discussão.
Também tivemos a oportunidade de conhecer a rede Gesturing Decolonial Futures Collective, a partir de uma apresentação de Dani d’Emilia e Sara Amsler, onde discutimos práticas incorporadas de (des)(re)aprender e (des)(re)fazer os guiões que levam à violência e insegurança estruturais dos grandes detonadores do Antropoceno - racismo, colonialidade, heteropatricarcado, nacionalismo.
Também visitamos, em Benavente, a Comunidade Portuguesa do Candomblé Iorubá de modo a entender os processos de migração e trânsito religioso do candomblé.
Debatemos com a artista-investigadora Alexandra do Carmo a partir do seu projeto Atelier Verde na IC19, o contexto das hortas informais da IC19, onde a “informalidade” é pretexto para invasões e remoções policiais, sobretudo no caso de pessoas racializadas.
Conhecemos outros projetos hortícolas da cidade, como a iniciativa de regeneração urbana e agricultura sintrópica em Campolide, numa visita guiada pela música Cátia Sá/ GUTA. Na Bela Flor Respira, o colectivo abre-se à respiração do bairro, cultiva-se para reflorestar e o que é plantado pode ser colhido por quem desejar.
Nos dia de portas abertas do estúdio contámos com uma apresentação do trabalho de Irineu Destourelles. Nesse dia, abriu-se uma conversa com a antropóloga Maria Helena Marques a partir do seu livro "Guardar as sementes: preservar a biodiversidade agrícola e a pluralidade cultural", e com Guy Massart, pesquisador independente e professor de antropologia no instituto Universitário MEI_A, Mindelo, Cabo-Verde, que realiza projectos etnográficos experimentais.
Também tivemos uma apresentação e práticas compartilhadas com Ana Pi, com o visionamento do seu filme "Noir Blue". Rita Natálio apresentou o filme “Ayvu Ypy - Origem da Língua” um filme que realizou com o realizador Guarani Nhandeva Alberto Alvares.